Me empreste seus ouvidos e eu te contarei sobre Anos Incríveis




Texto por Rodolfo Nícolas*

Não me lembro se foi depois da casa de leão ou quando Shiryu furou seus olhos, mas teve uma segunda-feira em que minha mãe me colocou de castigo e, após Cavaleiros do Zodíaco, eu não pude ir à rua para fazer arruaça com meus amigos maloqueiros. Os botões da televisão, como sempre, estavam ao alcance dos meus pés e fiquei zappeando até parar na TV Cultura e ouvir Joe Cocker e sua voz rouca cantando o clássico dos Beatles. (Claro que só soube desses detalhes da música e do cantor anos depois). Começava ali, com o primeiro episódio de Anos Incríveis - The Wonder Years, no original -, uma saga que eu acompanharia de episódio em episódio (ráááá, garanto que ninguém fez um introdução tão dramática com o nome do blog).

Em Anos Incríveis, Kevin Arnold narra a história da vida dele. Começando quando era um pré-adolescente preocupado em não apanhar de seu irmão mais velho e carrasco Wayne até o início da fase adulta e as preocupações com as namoradas, os empregos, a faculdade e tudo o mais. A série começa na época da Guerra do Vietnã e isso é percebido em vários episódios, principalmente nos que têm a participação de sua irmã hippie Karen. Completando o núcleo familiar, um pai durão (Jack) e uma mãe meiga e submissa (Norma) ao esposo, que vive completamente dedicada a ele e aos filhos.

Em grande parte do seriado são narradas as aventuras colegiais de Kevin, sua namoradinha, Winnie Cooper, e seu amigo Paul (que não é o Marilyn Mason). São mostrados grandes momentos de amizade e companheirismo entre eles, sem contar as bitocas e beijocas entre um dos pares românticos mais famosos das séries de TV. Lembro que gostava muito da química entre Paul e Kevin, o primeiro sendo atrapalhado e desengonçado e o segundo tentando ser legal e popular, o que contrastava muito com as atitudes do amigo de feições engraçadas e comportamento desprendido. Um dos melhores episódios é quando Paul convida Kevin para o seu Bar Mitzvah (bem antes do Nissim Ourfali) e eles vivem um choque cultural.

Mas, como todo mundo, Kevin cresce e o tempo passa para todos ao seu redor. Seu avô morre, Karen se casa e vai morar longe, aparecem uns sobrinhos, seu pai tem problemas no estômago (e também um estilhaço de granada na perna)... Winnie se muda para longe, namora com outras pessoas e, eventualmente, reata com nosso protagonista para depois acabar e começar tudo de novo. Paul vai fazer faculdade em outro lugar e não se dá muito bem com os novos amigos de seu melhor amigo de infância.

A série mostra o crescimento de Kevin e as mudanças das pessoas e do mundo ao seu redor de forma memorável. Apesar de ser um jovem alegre e sorridente, nem tudo em sua vida é só felicidade. Ele passa por momentos difíceis na série, como encarar a velhice de seu avô e não saber como ajudá-lo. Em alguns momentos, verdadeiras lições são dadas, como quando ele passou um dia no escritório do seu pai e finalmente compreende o motivo de, algumas vezes, ele chegar em casa estressado e querer apenas o silêncio para desligar a mente vendo TV (nem sempre é fácil se colocar no lugar do outro).  Logo no primeiro episódio um dos seu ídolos infantis morre de forma trágica.

Com uma trilha sonora sensacional (que é um dos motivos de não existir um box da série, pois torna impraticável pagar direitos autorais a tanta gente), Anos Incríveis é um clássico do mundo das séries e é muito recomendado para quem quer ver algo emocionante e divertido. Tudo é muito bem amarrado por ótimos roteiros, que dão uma aura mitológica a série. Muita coisa é lembrada tempos depois e tudo faz sentido nos encontros e desencontros da história.

Kevin vive Anos Incríveis no decorrer da série, assim como todos nós. A diferença é que às vezes não paramos para nos dar conta ou lembrar disso.

* Rodolfo Nícolas é um dos criadores do blog RecifEstranho e sempre se identificou quando chamavam Kevin de Sr. Anold...

2 comentários:

  1. Excelente texto sobre minha série favorita!

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  2. sempre tive vontade de assistir! será que vai ser tão massa se eu começar a ver aos 24 anos? óótimo texto!

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